segunda-feira, 1 de agosto de 2011

LOCKE, John (1632-1704). Carca acerca da tolerância (Epistola de tolerantia). In: Os Pensadores, Vol. John Locke. 2ª ed.: 1978.

Artigo


Págs. 4-5:
"A tolerância para os defensores de opiniões opostas acerca de temas religiosos está tão de acordo com o Evangelho e com a razão que parece monstruoso que os homens sejam cegos diante de uma luz tão clara. Não condenarei aqui o orgulho e a ambição de uns, a paixão, a impiedade e o zelo descaridoso de outros. Estes defeitos não podem, talvez ser erradicados dos assuntos humanos, embora sejam tais que ninguém gostaria que lhe fossem abertamente atribuídos, pois, quando alguém se encontra seduzido por eles, tenta arduamente despertar elogios ao disfarçá-los sobre cores ilusórias. Mas que uns não podem camuflar sua perseguição e crueldade não cristãs com o pretexto de zelar pela comunidade e pela obediência as leis; e que outros, em nome da religião, não devem solicitar permissão para a sua imoralidade e a impunidade de seus delitos; numa palavra, ninguém pode impor-se a si mesmo ou aos outros, quer como obediente súdito de seu príncipe, quer como sincero venerador de Deus: considero isso necessário sobretudo para distinguir as funções do governo civil e da religião, e para demarcar as verdadeiras fronteiras entre a Igreja e a comunidade. Se isso não for feito, não se pode pôr um fim às controvérsias entre os que realmente tem, ou pretendem ter, um profundo interesse pela salvação das almas de um lado e, por outro, pela segurança da comunidade."

Pág. 5:
"Em primeiro lugar, mostraremos que não cabe ao magistrado civil o cuidado das almas, nem tampouco a quaisquer outros homens. Isso não lhe foi outorgado por Deus, porque não parece que Deus jamais tenha delegado autoridade a um homem sobre outro para induzir outros homens a aceitar sua religião. Nem tal poder deve ser revestido no magistrado pelos homens, porque até agora nenhum homem menosprezou o zelo de sua salvação eterna a fim de abraçar em seu coração um culto ou fé prescritos por outrem, príncipe ou súdito. Mesmo se alguém quisesse, não poderia jamais crer por imposição de outrem. É a fé que dá força e eficácia à verdadeira religião que leva à salvação. Seja qual for a religião que a gente professa, seja qual for o culto exterior com o qual se está de acordo, se não acompanhados de profunda conviccção de quem é verdadeira e outro agradável a Deus, em lugar de auxiliarem, constituem obstáculos à salvação. Dessa maneira, em lugar de a gente expiar seus outros pecados pelo exercício da religião, oferecendo a Deus Todo-Poderoso um culto que acredita ser de Seu agrado, acrescenta aom número de seus pecados os da hipocrisia e desrespeito à Divina Majestade."

Pág. 24-25:
"Falemos francamente. O magistrado teme as outras igrejas e não a sua, porque favorece e trata bem sua igreja, sendo severo e cruel com as outras. Enquanto esta é tratada por ele como criança, merecedora até de suas brincadeiras. Ao passo que aquelas, embora seus membros tenham vida impecável, são por ele escravizadas, sendo seus memebros frequentemente recompensados com trabalho forçado, prisão, confiscação de propriedade e morte. enquanto favorece uma, a outra é constantemente castigada. Mude, todavia, o magistrado de posição, ou gozem os dissidentes dos mesmos direitos dos outros cidadãos em negócios civis, e verificar-se-á imediatamente que termina o medo das reuniões religiosas. Não é pelo fato de os homens se agruparem em torno de uma religião que se divide em facções antagônicas, mas porque a opressão os torna miseráveis. Os governos justos e moderados são por toda a parte tranquilos e seguros; mas, quando os homens são oprimidos pela injustiça e tirania, eles são sempre recalcitrantes. Sei que muitas das sedições começam frequentemente por pretexto de religião; mas é igualmente verdadeiro que no interesse da religião os súditos são frequentemente maltratados e vivem miseravelmente. Creiam-me, pois, que esses distúrbios não resultam de qualquer temperamenteo particular desta ou daquela igreja ou sociedade religiosa, mas da disposição comum dos homens, que, quando arcam com o sfrimento injusto, tentam sacudir a canga que oprime seus pescoços. Suponhamos que a religião fosse excluída dessa consideração, e que as características físicas fossem encaradas como as bases das distinções, e que os homens de cabelos pretos ou olhos verdes fossem tratados diversamente pelos outros cidadãos, de sorte que não pudessem comprar ou vender livremente, e fossem proibidos de desempenhar suas profissões; que os pais fossem despojados da educação e cuidado de seus filhos; que os tribunais lhe estivessem fechados e predispostos contra eles. Por que não se pensará que o magistrado tem tanto a temer desses, que nada tem em comum exceto a perseguição e as cores de seus cabelos e olhos, como dos outros associados pela religião? Alguns se associam por negócio, outros que estão desocupados, para se divertirem. Alguns se reúnem mediante relação social porque vivem na mesma cidade e moram na mesma vizinhança; outros reúnem-se para participarem do mesmo culto religioso. Mas há apenas uma coisa que reúne as pessoas para a sedição, ou seja, a opressão."

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